quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Dica Cultural da Semana 27/08/2014 - A Batalha do Chile - Parte 1: A Insurreição da Burguesia, de Patrício Guzmán




Nas próximas três semanas iremos colocar à disposição de vocês um breve comentário e o link para assistir à trilogia de documentários intitulada "A Batalha do Chile". Os documentários registram em grande parte os acontecimentos marcantes que precedem ao governo do socialista Salvador Allende à frente da Unidade Popular (UP), seu período no governo chileno (1970-73) e o Golpe de Estado.

Iniciaremos aqui a indicação da primeira da parte do documentário dirigido por Patrício Guzmán. A parte 1 do documentário tem como subtítulo: A Insurreição da Burguesia. O segundo: O Golpe de Estado. O terceiro: O Poder Popular.




O ano era 1973, dia 11 de setembro, pouco mais das 8:00 da manhã. Oficiais de alta patente, entre eles Augusto Pinochet, então comandante-em-chefe das Forças Armadas, rebelaram-se contra o governo com o apoio de inúmeros regimentos dos blindados de Santiago, com maciça sustentação da Marinha e com o usufruto da logística e armamento estadunidense.

O fatídico dia em que se consolida mais um Golpe de Estado na América Latina, não pode ser entendido como mero acaso ou como um ato descolado de seu contexto histórico social e político.

Desde os anos 1920, vinha acontecendo no Chile uma intensa reorganização e remodelação dos diversos grupos econômicos dominantes. Ainda nos 1920, surgem novos protagonistas políticos que darão uma nova roupagem para um processo social mais amplo: a classe média e a concretização da Revolução Burguesa no Chile.

É importante notar que a classe média assume a ponteira da discussão política nos anos 1930 e 1940 por conta da ascensão de um velho partido, o Partido Radical. Sua proposta de condução do Estado promovendo uma reestruturação político-institucional é avistada como importante para os setores da classe trabalhadora. Em seu início, o período conhecido como Radicalismo, conta com o apoio e coligação eleitoral do Partido Comunista do Chile, uma das principais organizações dos trabalhadores. No entanto, após algumas divergências de ordem social, a configuração política se desenha insustentável para a manutenção do apoio dos comunistas, que acabam rompendo com o Radicalismo.

Toda a efetividade de uma política de centro-esquerda dá espaço para uma nova coalizão de centro-direita, ainda liderada pelo Partido Radical, mas que, agora, não mais dirige estas reestruturações no sentido de ampliar a democratização dos espaços políticos e promover uma inserção contundente da classe trabalhadora na discussão de um projeto de país.

Este movimento de espectro restritamente político está em consonância com a necessidade posta de se ter um novo projeto de país. A grande disputa esteve entre um projeto de industrialização (liderada pelo PR e com apoio da esquerda) e o projeto reacionário e conservador liderado pelo Partido Nacional, local de aglomeração dos latifundiários e católicos.

Contudo, a predominância do Radicalismo se encerra em 1952 com a eleição do candidato da direita, Jorge Alessandri. Este é um momento-chave também pois é possível visualizar um grave racha no movimento católico com a fundação do Partido Democrata Cristão no Chile. Ele, crescentemente, é quem assumirá as intenções e as demandas da classe média no país.

Torna-se, rapidamente, uma das principais forças eleitorais chilenas com inserção no movimento sindical. No que se refere à classe trabalhadora, neste período iniciam-se as tentativas de uma frente de esquerda. Formula-se, para as eleições de 1970, a Unidade Popular, uma frente de coalizão de todos os movimentos e forças políticas de esquerda: Partido Socialista, Partido Comunista, Mapu, MIR, dentre outras.

A disputa acirrada entre as mais variadas frações da burguesia no campo das eleições era conseqüência, e também impulsionadora, de um amplo espectro de mudança. Havia, pelo menos desde a década de 1920, a disputa política por um novo projeto de nação que engendra novas formas de produção.

A dualidade industrialização x latifúndio foi levada às últimas conseqüências. No entanto, como a história dos homens é feita por eles mesmos, a dinâmica da vida social não é mecânica e pré-determinada. Neste entrevero surge, amadurece e põe-se em disputa um projeto, com sua equivalente eleitoral (Unidade Popular), de uma nova sociedade. Concretiza-se ao longo de todo este tempo uma alternativa comunista.

Desde os anos 1920, a necessidade de modernizar o país obrigou que burguesia desse uma resposta. Dentro da ampla classe dominante, o projeto não foi um só. Acontece que na construção política de uma nova base social de produção, um outro projeto, o revolucionário dos comunistas, se articularam e colocaram-se como alternativa. A vitória da UP é demonstração da força, do avanço nas consciências de classe e do enraizamento da proposta comunista. A burguesia e os latifundiários unificaram-se em um "novo" projeto onde a classe trabalhadora permaneceria fora do processo decisório.

            Este projeto ficou vinculado à figura de Augusto Pinochet, como o herói da cidadania chilena, o homem de retidão moral que refundaria o Estado chileno. Assumiu a postura de equivaler-se à um novo amontoado de instituições e modalidades de gestão públicas. Foi a mão forte do mercado e o rosto "rejuvenescido" da proposta programática liberal.

No lugar de grandes transformações que a burguesia bradou ao longo do século, concretizou-se o mais do mesmo: FAÇAMOS NÓS, A BURGUESIA, A REVOLUÇÃO (em nosso interesse!) ANTES QUE O POVO A FAÇA.

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