Hoje
é dia de relembrar mais um dia sórdido para a humanidade. Não se trata de
falarmos do 11 de setembro estadunidense, mas da destruição de um sonho, de um
projeto novo de humanidade, de relações sociais novas, de uma nova vida.
Quando
da eleição de Allende, o mundo atentou-se para um novo projeto ousado de
construção da via chilena ao socialismo.
Trata-se de um grande projeto de tomada do Estado e posteriormente colocar em
prática, pela legalidade própria da democracia burguesa, os pressupostos de uma
nova sociabilidade que fossem para além de si, isto é, que tivesse como fim
último, destruir a si próprio.
Diante
de toda coalizão feita para que Allende fosse eleito presidente e que tivesse à
disposição (sua e da causa socialista) uma grande bancada de socialistas de
comunistas, muitos param para observar somente os avanços dentro dos marcos da
legalidade burguesa e não observam as efervescências das ruas e a construção de
um outro mundo fora dos limites da institucionalidade do Estado.
Todo
processo de acirramento da luta de classes que podemos observar (e já
demonstramos de alguma forma nos textos anteriores), empurra Allende a assumir
posturas cada vez mais radicalizadas. A disputa política que havia no interior
da Unidad Popular contribuía para a aglutinação de uma grande base social de
apoio ao governo. Isto é facilmente comprovado com os números de aprovação, o
aumento da bancada de deputados em 1972, auge da radicalização e polarização
política entre UP e oposição, e a quantidade de pessoas na rua, quase
semanalmente, em protestos em defesa dos avanços.
O
fato de que Allende era um convicto defensor da "revolução pacífica",
se é que assim podemos chamar, o colocou em uma sinuca de bico para com seus
aliados mais à esquerda, e com os oposicionistas por conta do conteúdo
democratizador que suas propostas tinham.
Durante
os três anos de governo, muito se acreditou ter conseguido controlar de fato o
Estado chileno, isto é, os três poderes (Executivo, Legislativo e o
Parlamento). Esta certeza talvez os possa ter obscurecido algumas leituras de
conjuntura. Comum em seu governo, Allende contava com uma ampla campanha internacional
contra seu mandato e com a participação direta da CIA (Serviço de Inteligência
dos EUA) financiando grupos paramilitares de extrema-direita.
Agora,
o que nos interessa é demonstrar como a população de fato incorporou o projeto
socialista da UP e o pôs em prática em diversas ações, localizadas ou não, que
puderam demonstrar o quanto estava crescente o avanço da consciência de classe
nos grupos subalternos, na classe trabalhadora.
Em
um primeiro momento, com o boicote dos produtores rurais e dos comerciantes, o
governo criou as Juntas de Abastecimento Popular, que foi levada a diante
graças ao esforço militante e ação convicta de grande parcela da população que
apoiava a UP. Poderiam ter debandado rapidamente pois conviver com a falta de
alimentos essenciais para suas famílias, facilmente levariam muitos a
considerar que a UP não era uma opção para governar.
No
entanto, o que se observou? A classe trabalhadora, dado sua consciência de
classe mais avançada, tinha clareza dos reais culpados por sua penúria e agiram
firmemente em dois sentidos: 1) na defesa do projeto socialista e do governo;
2) na consolidação das JAP's, isto é, na distribuição igualitária (e por vezes
racionada) dos alimentos e demais itens de atenção primária.
Isto
não poderia ser somente solidariedade com o mais próximo? Tanto poderia como,
de fato, o era. Contudo, esta solidariedade não se prendia ao seu significado
comum que vemos no cristianismo: a solidariedade observada neste trabalho
militante é de um alcance profundo e de uma entrega, com toda certeza,
revolucionária. Era a doação contundente de seu tempo e disposição em prol de
um futuro radicalmente diferente para os seus filhos e afins.
Uma
segunda demonstração da convicção revolucionária da classe trabalhadora chilena
foi a criação dos cordões industriais no entorno de Santiago e em diversas
outras regiões do Chile. Estes cordões são a explicitação mais clara do que se
convencionou chamar de Poder Popular. E porquê? Porque foram ações coordenadas
de auto-organização da classe trabalhadora para manter a produtividade de
setores essenciais para os arrecadamentos do Estado, que por sua vez, investia
na qualidade de vida da população.
Tais
cordões representavam a interligação de diversos ramos da indústria do Chile e
da produção precisa dos itens que o país necessitava para que não entrasse em
colapso financeiro por conta do boicote internacional de vendas, compras e
empréstimos ao governo da Unidad Popular.
Semelhante
à estes cordões, muito se fez no campo. O avanço da Reforma Agrária (forçada em
muitas ocasiões) foi significativo e iniciou um novo cenário social no que diz
respeito à distribuição e socialização da terra e de suas benesses (alimentos e
afins).
O
que podemos tirar de grandioso desta maravilhosa experiência da Unidad Popular
no Chile é que neste período se ousou sonhar (e construir de fato) uma nova
experiência de sociedade. Ainda que em muitos aspectos estivessem presos à
institucionalidade e mediocridade da vida burguesa (tal qual temos hoje no
Brasil), naquele momento a classe trabalhadora estava em um patamar de
consciência de classe muito avançado e já não se contentava com as misérias
cotidianas que não são impostas pelo capitalismo.
Nos
corações e mentes dos chilenos, palpitavam um outro mundo, uma nova sociedade e
um novo entendimento de como devem ser as novas relações sociais. Mas, mais do
que isto, os braços e pernas caminharam no sentido de tornar real estes desejos
e utopias.
É
por isso, tomando-os também como exemplo, é que o PCB tem como principal
projeto para as eleições de 2014 realizar um debate sincero com a população
acerca da necessidade de construirmos um novo mundo. É por isso que nosso
programa de campanha tem como palavra de ordem: PODER POPULAR: POR UM BRASIL SOCIALISTA!
Todo
o alvorecer cultural que brotou do esforço cotidiano monumental de milhões de
chilenos deve sempre ser, para nós, uma grata contribuição para o entendimento
de nossos sonhos. Foram fiéis ao desejo da transformação radical, morreram em
nome de outro mundo para os futuros viventes. Ousaram sonhar, ousaram lutar
para consolidar o que de mais humano podemos oferecer uns aos outros: uma vida
e não somente a sobrevivência desumanizadora em que estavam inseridos e ainda estamos
nós.
É
em busca do Poder Popular que nós, militantes do PCB, ousamos sonhar junto.
Mauro Iasi, candidato a presidência pelo PCB, disse certa vez, e consideramos
que muito diz sobre nós: "Se perdermos nossa capacidade de sonhar, de
ousar, de imaginar que um outro mundo pode ser possível, teremos perdido aquela
que é, talvez, a qualidade mais essencial do ser humano. É ISSO QUE ACREDITAM
OS COMUNISTAS!"
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